Veritas Ipsa

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

O NATAL ESTÁ SENDO PERDIDO?


Herodes também celebra o Natal

Um dos sinais mais evidentes da sobrenaturalidade do Natal não se dá na manjedoura onde Jesus nasce, mas no palácio onde Herodes reside. Como os pastores que cuidavam dos seus rebanhos, como os sábios provindos do Oriente, Herodes reconhece a sobrenaturalidade do nascimento de Cristo. E, como os pastores e os sábios, se apressa a celebrá-lo... a seu modo. Nós, cristãos, celebramos, com o Natal de Cristo, o advento de uma nova era: nossa natureza decaída é finalmente redimida; e essa redenção, que não passa despercebida de seus beneficiários, tampouco poderia, em seu máximo, produzir danos.

Certa iconografia cristã retratou o Natal com traços de ternura e suavidade, adulterando o sentido profundo do Reinado que se instaura, o qual não é um reinado pacífico (ou somente o é se considerarmos que o Natal é uma prefiguração da Parusía), mas de combate. As campanhas de Natal - nos recorda Chesterton - sonham com o barulho dos canhões, pois o que o Natal vem instaurar é uma cruel batalha, uma guerra incessante contra quem, na narração evangélica, é representado por Herodes.

Herodes combate o Natal matando crianças. É um traço característico (ou, dito mais propriamente, constitutivo) de todos os cultos demoníacos de ódio pelas novas vidas; isto porque em toda nova vida se resume a Nova Aliança que Deus estabeleceu com os homens. E visto que toda nova vida adquire aos olhos de Deus uma condição sagrada, adquire também, aos olhos do Inimigo, a condição de vítima propiciatória. Isto, que é uma verdade teológica profunda - mesmo que os padres já não falem falem mais do Inimigo -, é também uma verdade histórica irrefutável. Em todos os ocasos da História, as novas vidas têm sido perseguidas sem piedade: sua fragilidade golpeada, sua inocência escarnecida, sua dignidade vituperada, sua própria existência perseguida com brutal e eficiente ódio.

Neste novo ocaso da História, a perseguição herodiana das novas vidas se estende até aquilo que os Profetas do Antigo Testamento denominavam "a abominação da desolação", isto é, até a profanação do recinto sagrado onde toda nova vida encontra refúgio e sustento. A conversão do seio materno em um campo de batalha onde se exerce a mais feroz das violências contra as novas vidas constitui a mais estremecedora manifestação demoníaca de nossa época - e é a forma pela qual Herodes continua celebrando o Natal.

Herodes celebrou o Natal deixando-se arrastar por um momento repentino de cólera, mas o Inimigo não costuma empregar estratégias tão grosseiras; pelo contrário, costuma a mascarar seus crimes sob uma fachada de humanitarismo farisaico. E uma de suas estratégias favoridas consiste em adotar argumentos que favoreçam o ofuscamento da consciência moral: "Ai daqueles que chamam o 'mal' de 'bem' e o 'bem' de 'mal'; que fazem da 'luz', trevas; e das 'trevas', luz; que trocam o 'amargo' pelo 'doce' e o 'doce' pelo 'amargo'" - exclamava Isaías. Os inimigos das novas vidas chamam agora de 'direito' àquilo que é um crime; e disfarçam de filantropia e feminismo ao que nada mais é do que ódio essencial à linhagem humana e eterna inimizade contra a mulher. Este ódio é de índole demoníaca e todos os álibis ideológicos que esgrimem para justificá-lo ou maquiá-lo com enfeites nada mais são do que [simples] disfarce de quem disse: "Non serviam" (="Não servirei").

Existe uma passagem bastante enigmática e controvertida das Escrituras (2Tessalonicenses 2,3-8), em que São Paulo se refere a um misterioso "obstáculo" que retém o ímpio e o impede de se manifestar; basta que tal obstáculo se retire - nos diz São Paulo - para que sobrevenham os Últimos Tempos. Eu sempre identifiquei esse "obstáculo" com o discernimento moral do homem, com a capacidade que o homem possui para emitir, mediante a razão, um juízo objetivo sobre o que está certo e o que está errado, conforme estabelecia Aristóteles em sua "Política". A perseguição herodiana contra as novas vidas, sancionada legalmente e aceita socialmente, nos indica que tal discernimento se obscureceu e que talvez o obstáculo tenha sido removido.

Feliz e santo Natal a todos. E não se esqueçam que o Natal somente pode ser celebrado combatendo-se Herodes.

Autor: Anônimo
Fonte: www.encuentra.com
Tradução: Carlos Martins Nabeto