Veritas Ipsa

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

PEDRO CRUCIFICADO DE CABEÇA PARA BAIXO

A ACUSAÇÃO COMUM:

É completamente infundada e absurda a Tradição católica que afirma que o Apóstolo Pedro foi crucificado de cabeça para baixo.

A VERDADE, CÁ:

Antiquíssimos escritores eclesiásticos informam:



"Pedro, ao ser martirizado em Roma, pediu e obteve fosse crucificado de cabeça para baixo" (Orígenes [+séc.III], Com. in Genes. 3).

"Pedro, finalmente tendo ido para Roma, lá foi crucificado de cabeça para baixo" (Eusébio de Cesaréia [+séc.IV], História Eclesiástica 3,1).

AS SEMENTES DA VERDADE, LÁ:

Diversas comunidades protestantes reconhecem que Pedro foi de fato crucificado de cabeça para baixo, como se verifica nas seguintes fotos:



Chaves entregues a Pedro, em forma de cruz invertida - Igreja Episcopaliana de São Pedro de Charlotte, Nova Carolina, EUA (http://www.st-petersweb.org/)


Vitral contendo os símbolos ligados a Pedro: as chaves, o galo e a cruz invertida - Igreja Luterana de Cristo, Las Vegas, EUA (http://www.christlutheranlasvegas.org/)


Vitral apresentando Pedro segurando as chaves do Reino; sobre sua cabeça, o galo; sob seus pés, a cruz invertida - Catedral Presbiteriana da Trindade, Sacramento, Califórna, EUA (http://www.trinitycathedral.org/)


Ornamento sacro apresentando a cruz invertida de São Pedro - Igreja Anglicana de São Pedro ad Vincula, Stoke on Trent, Inglaterra (http://www.thepotteries.org/church/stoke/st_peters.htm)


Vitral apresentando as chaves do Reino entre uma cruz invertida - Igreja Cristã dos Discípulos de Cristo, Cleveland Hights, Cheektowaga, Nova Iorque, EUA (http://www.welgoss.com/chcc/secondaryindex.html)


Pedro, no extremo esquerdo do vitral, tem sobre a sua cabeça o símbolo das chaves e uma cruz invertida - Igreja Batista de Broadway, Fort Worth, Texas, EUA (http://www.broadwaybc.org/worship/windows/commission.html)


Além dessas imagens protestantes, há também protestantes que sustentam o mesmo com palavras. Por exemplo:

  • "O Novo Testamento não nos diz o que ocorreu com a maioria dos Apóstolos. Atos nos conta sobre a morte de Tiago, o irmão de João. Contudo, o próprio livro dos Atos nos deixa em suspenso ao terminar, dizendo-nos que Paulo pregava livremente em Roma. O que ocorreu então com Paulo e também com os demais Apóstolos? Desde tempos muito antigos surgiram tradições que afirmavam que tal ou qual Apóstolo havia estado em tal ou qual lugar, ou que havia sofrido o martírio de uma forma ou de outra. Muitas dessas tradições são induvidavelmente resultantes do desejo por parte de cada igreja em cada cidade poder afirmar sua origem apostólica; porém, outras são mais dignas de crédito e merecem ao menos que as conheçamos. De todas essas tradições, provavelmente a que é mais difícil de duvidar é a que afirma que Pedro esteve em Roma e que sofreu o martírio nessa cidade durante a perseguição de Nero. Este fato encontra testemunhos em vários escritores cristãos datados desde o fim do século I e de todo o século II e, portanto, deve ser aceito como historicamente correto. Ademais, tudo parece indicar que a 'Babilônia' a que se refere 1Pedro 5,13 seja Roma: 'A igreja que está na Babilônia, eleita juntamente conosco, e Marcos, meu filho, vos saúdam'. Por outro lado, a mesma tradição que afirma que Pedro morreu crucificado - alguns autores afirmam que de cabeça para baixo - encontra ecos em João 21,18-19, onde Jesus diz a Pedro: 'Quando eras mais jovem, te cingias e ias aonde querias; mas quando fores velho, estenderás tuas mãos e outro te cingirá e te levará para onde não queres ir'. E o Evangelista acrescenta como comentário: 'Isto disse dando a entender com que tipo de morte haveria de glorificar a Deus'" (GONZÁLEZ, Justo L.. "Historia del Cristianismo", Tomo 1. Miami: Editoria Unilit, 1994, Capítulo 4, Seção 3). 

domingo, 9 de janeiro de 2011

CARACTERÍSTICAS DAS HERESIAS


No ano 144 d.C., durante um dos momentos mais difíceis da História da Igreja Católica, surgiu a heresia Marcionita que logo se estenderia principalmente pelo Império Bizantino e sobreviveria pelos próximos três séculos, até ser absorvida pelo Maniqueísmo e desaparecer. É possível que seu fundador, Marcião, fosse filho de um dos primeiros bispos de Sinope, uma diocese da Ásia Menor, de onde Marcião era originário. Há quem suponha (baseando-se na conhecida habilidade de Marcião para citar as Escrituras) que ele fosse um bispo renegado pela Igreja. Qualquer que fosse o caso, o certo é que Marcião deu origem a uma das mais persistentes heresias de seu tempo e, para isso, fez uso, pela primeira vez, de certas armas que todos os cristãos dissidentes empregariam no futuro até os nossos dias.

O gênio divisionista de Marcião criou uma nova doutrina pseudocristã, modificando a História Sagrada e publicando um cânon próprio das Escrituras. Isto que hoje nos parece tão familiar - depois de tantos séculos de Bíblias cerceadas, lendas negras e traduções deturpadas da Escritura - era então uma assombrosa novidade que cativou a muitos. Marcião sustentava, como muitos vieram a fazer desde então, que o Deus do Antigo Testamento era vingativo e colérico, que não podia corresponder à mansa e amorosa pessoa de Jesus. A partir de então, desenvolveu uma doutrina dualista que sustentava a existência de duas divindades, uma má (a do Antigo Testamento) e outra boa (a do Novo Testamento).

Ao iniciar uma nova igreja, sempre se tropeça com este problema: o que fazer com a Igreja Católica? Marcião não podia destruir a Igreja de Cristo, porém, podia desqualificá-la. Para isso, teve uma idéia que para nós parece bem desgastada, mas que era muito original naquela época: usar as Escrituras para impugnar a veracidade da doutrina católica.

O problema de usar essa estratégia é que as Escrituras do Antigo Testamento - inspiradas por um "deus mau", segundo Marcião - ofereciam amplo e suficiente testemunho da futura vinda de Jesus. Essa "pequena" inconsistência não foi grande problema para o líder herege, que declarou nulo todo o Antigo Testamento. Ao fazer isto, Marcião estabeleceu outro grande princípio, que quase todo movimento herético seguiria no futuro: eliminar as partes da Bíblia que não convenham à nova doutrina enquanto que, ao mesmo tempo, se exalta a Escritura (modificada) como a autoridade sobre a qual o novo grupo eclesial é fundado.

Recordemos que Marcião apareceu no cenário cristã menos de cinco décadas depois de ter falecido o último Apóstolo de Cristo. A Igreja de então suportava frequentes perseguições, algumas locais e outras mais estendidas. Os Evangelhos e os demais escritos cristãos circulavam sem que houvesse um cânon definido e universal. A Bíblia da Igreja Católica desses anos era a versão dos LXX (ou Septuaginta Alexandrina), que consistia basicamente dos livros que hoje encontramos no Antigo Testamento da Bíblia Católica.

As razões para a ausência de um cânon cristão eram várias, principalmente as constantes perseguições que tornavam impossível aos bispos se reunirem em sínodos gerais, os quais seriam muito perigosos por razões óbvias. Passariam-se quase três séculos até que se apagassem as perseguições imperiais e os bispos pudessem se reunir livremente para considerar quais escritos deveriam ser aprovados para sua inclusão no Novo Testamento. Uma das boas coisas que ocorreu por consequência da heresia marcionita foi justamente isto: a Igreja Católica tomou consciência da importância de possuir uma lista ordenada de escritos cristãos autorizados.

Antes que a Igreja pudesse produzir tal lista, Marcião criou um "evangelho" de sua própria lavra. Nele declarava que o invisível, indescritível e benévolo Deus (aoratos akatanomastos agathos theos) teria se apresentado entre os judeus pregando no dia de sábado. O pseudo-evangelho de Marcião era uma versão modificada do Evangelho de Lucas, editado para apoiar as doutrinas dualistas do fundador da seita.

A esta altura, encontramos no movimento marcionista as características que logo se repetem nas heresias surgidas posteriormente:

1. A base da doutrina é um texto - a Escritura - e não o Depósito da Fé recebido por toda a comunidade, como na Igreja Católica.

2. O texto da Escritura é alterado ou redigido para afirmar as doutrinas do novo grupo, criando assim uma nova e distinta tradição. O oposto ocorre na Igreja Católica, que preserva cuidadosamente e exalta o papel da Escritura dentro do contexto da Sagrada Tradição.

3. Altera-se o contexto histórico ou até a própria História. Isto é feito com o duplo sentido de afirmar a própria doutrina e, ao mesmo tempo, impugnar a Igreja Católica, acusando-a de ser ela quem "conta a História à sua maneira". Curiosamente, estas acusações tão imaturas imprimiram na Igreja o costume de documentar o desenvolvimento da sua própria doutrina na História. Na Igreja Católica a História, as Escrituras e a Doutrina da Igreja devem estar obrigatoriamente de acordo, sempre sem deixar espaço para dúvidas. É por isso que sabemos com certeza que hoje cremos na mesma fé declarada por Cristo e pelos Apóstolos.

Consequentemente, um dos testemunhos mais fortes que pode ser oferecido em favor do Catolicismo é a sua consistência e coerência durante vinte [e um] séculos de História. O mesmo não ocorreu com os marcionitas, que se dividiram em diversas seitas e, de uma espécie de puritanismo original, logo passaram para o Gnosticismo e, depois, para o Maniqueísmo, movimento que acabou absorvendo o Marcionismo por completo. Disto podemos deduzir uma quarta característica das heresias: sua instabilidade.

4. A instabilidade doutrinária e sua consequência (as divisões sectárias), identificam todas as heresias. Seguindo o ditado de "quem com o ferro mata, pelo ferro morrerá", os criadores de divisões na Igreja logo recebem na própria carne o seu amargo remédio.

Podemos afirmar, sem medo de errar, que todos os movimentos dissidentes do Cristianismo que se afastaram da Igreja Católica possuem estas quatro características em menor ou maior grau. Quando Cristo pregou a parábola da videira, disse assim:

"Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o lavrador. Toda a vara em mim, que não dá fruto, a tira; e limpa toda aquela que dá fruto, para que dê mais fruto. Vós já estais limpos, pela palavra que vos tenho falado. Estai em mim, e eu em vós; como a vara de si mesma não pode dar fruto, se não estiver na videira, assim também vós, se não estiverdes em mim. Eu sou a videira, vós as varas; quem está em mim, e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer. Se alguém não estiver em mim, será lançado fora, como a vara, e secará; e os colhem e lançam no fogo, e ardem. Se vós estiverdes em mim, e as minhas palavras estiverem em vós, pedireis tudo o que quiserdes, e vos será feito. Nisto é glorificado meu Pai, que deis muito fruto; e assim sereis meus discípulos. Como o Pai me amou, também eu vos amei a vós; permanecei no meu amor. Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor; do mesmo modo que eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai, e permaneço no seu amor. Tenho-vos dito isto, para que o meu gozo permaneça em vós, e o vosso gozo seja completo. O meu mandamento é este: Que vos ameis uns aos outros, assim como eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos seus amigos. Vós sereis meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando" (João 15,1-14).

É inegável a importância destas palavras de Cristo. A Igreja deve operar em união com Cristo e em unidade interna. É a única maneira de produzir "fruto", isto é, a salvação das almas. Quem espera agir fora desta ordem que Cristo estabeleceu deixa de permanecer em Seu amor. Para permanecer no amor de Cristo, entende-se que devemos guardar os Seus mandamentos. Nesta simples parábola, Cristo resumiu as qualidades da Igreja que deverá durar até o fim do mundo. Todas elas provêm do amor cristão:

- A primeira qualidade é a humildade. Cristo é a videira, a plenitude da fé e o todo da Igreja, enquanto que seus discípulos são os ramos que se nutrem Dele. Não existe outra ordem pela qual algum dos ramos possa dar origem a outra videira distinta.

- A segunda qualidade é a obediência. Somos amigos de Cristo se fizermos o que Ele nos diz. Não há outra opção se O amamos.

- A terceira qualidade é consequência das outras duas: a união. A indivisibilidade da planta produz fruto que dá glória a Deus em Cristo. Essa união é o resultado visível do amor que começa em Cristo e se multiplica nos discípulos.

Como não ocorre - nem nunca ocorrerá - entre aqueles que se separam da Igreja Católica, estas três qualidades distintas produzem o milagre da duração da Igreja na História, que é por si mesma um poderoso testemunho da verdade do Evangelho. Quando Cristo nos adverte que sem Ele não podemos fazer nada, também agrega que nossa relação com Ele só pode ser frutífera. Sem Cristo, os ramos morrem sem dar fruto; com Cristo, a Igreja continua no mundo e na História, dando testemunho do Seu amor em perfeita união. Este é o fruto cristão por excelência!

Tendo comparado as qualidades próprias das heresias e da Igreja, não nos surpreende que as Palavras de Cristo se cumpram na História. Apenas a Igreja fundada por Cristo sobrevive dando testemunho ao longo dos séculos e ao mundo inteiro com a doutrina integral recebida de Cristo. Não importa quão numerosos sejam os membros de uma seita; sabemos que passarão enquanto que a Igreja continuará sua missão até que Jesus retorne. Os poderes malignos continuarão criando divisões, pois isto é da sua natureza; mesmo assim, não prevalecerão contra toda a Igreja (Mateus 16,13-20).

A Igreja já viu passar centenas de seitas, movimentos dissidentes, heresias crassas e toda espécie de inimigos. O testemunho da História é apenas um: a Igreja SEMPRE permanece e seus inimigos SEMPRE passam, pouco importando quão forte ou astuto tenham sido seus adversários. Aquele que a sustenta nunca dorme e Seu braço protetor jamais descansa!

Autor: Marcus Grodi
Fonte: http://www.prodigos.org
Tradução: Carlos Martins Nabeto

sábado, 8 de janeiro de 2011

O QUE DISSE O PAPA SOBRE OS PRESERVATIVOS?

O novo livro de Bento XVI, "Luz do Mundo: o Papa, a Igreja e os Sinais dos Tempos", nem sequer tinha sido publicado e já estava no centro de uma controvérsia nos meios de comunicação on-line.

A polêmica explodiu na semana passada, quando o L'Osservatore Romano violou unilateralmente o embargo sobre o livro, publicando alguns extratos em língua italiana das diversas declarações do Papa, para grande desgosto dos editores em todo o mundo, que trabalhavam cuidadosamente visando um lançamento orquestrado do livro, que se daria na terça-feira seguinte.

Um dos extratos tratava do uso de preservativos para tentar evitar a propagação da AIDS e a imprensa imediatamente tirou proveito disto (p.ex.: Reuters, Associated Press, BBC Online). E assim, surgiram manchetes como:

- Papa diz que os preservativos são admissíveis em certos casos para deter a AIDS
- Papa: "Os preservativos justificam-se em alguns casos"
- Papa diz que os preservativos podem ser usados na luta contra a AIDS

Particularmente notória é a declaração de William Crawley, da BBC:

"O Papa Bento XVI parece ter alterado a postura oficial do Vaticano sobre o uso de preservativos, adotando uma posição moral que muitos teólogos católicos já recomendavam há muito tempo".

Bah!

Pois bem: em primeiro lugar, trata-se de um livro de entrevistas. O Papa foi entrevistado. Não estava exercendo seu múnus oficial de ensinar. Este livro não é uma encíclica, uma constituição apostólica, uma bula papal, nem nada semelhante. Não é uma publicação da Igreja. Trata-se de uma entrevista realizada por um jornalista, em idioma alemão. Consequentemente, o livro não representa um ato do Magistério da Igreja, nem tem a capacidade de "alterar a postura oficial do Vaticano" em nada. Não possui força dogmática nem canônica. O livro - que é fascinante e sem precedentes, mas isto é tema para outra oportunidade - constitui aquilo que se classifica como opiniões pessoais do Papa sobre as perguntas questionadas pelo entrevistador Peter Seewald.

E como o Papa Bento XVI observa no livro:

"Há que se dizer que o Papa pode ter opiniões privadas que se encontram equivocadas".

Não estou assinalando isto para insinuar que naquilo que o Papa Bento XVI fala a respeito dos preservativos está incorreto - chegaremos a este ponto ao seu tempo - mas para indicar o contexto da situação, deixando claro que se trata das opiniões privadas do Papa. São apenas isto: opiniões privadas. Não é ensino oficial da Igreja. Então, continuemos...

Entre os desserviços do L'Osservatore Romano feitos para romper o embargo do livro da maneira que fez, houve também o fato de que apenas publicou um pequeno trecho da seção em que o Papa discutia sobre o uso dos preservativos. Como resultado, o leitor não tinha como ver o contexto das suas declarações e, assim, garantir que a imprensa secular não estava tomando as observações do Papa fora do seu contexto (o que seria feito de qualquer modo, mas talvez nem tanto). Especialmente notório é o fato de que o L'Osservatore Romano omitiu o material onde Bento esclarece sua declaração sobre os preservativos, em uma pergunta logo a seguir.

Com efeito, o L'Osservatore Romano causou um grande dano tanto às comunidades católicas quanto às não-católicas.

Felizmente, agora você pode ler o texto completo das declarações do Papa.

Ademais, prevendo a controvérsia que estas palavras poderiam produzir, a drª. Janet Smith preparou um guia útil sobre o que o Papa disse e não disse.

Lancemos vista aos comentários do Papa, para ver o que ele realmente disse.

"Seewald: (...) Na África, se apontou que o ensino tradicional da Igreja demonstrou ser a única maneira segura de se deter a propagação do HIV. Os críticos, incluindo a crítica dentro das próprias fileiras da Igreja, objetam que é uma loucura proibir a população de alto risco de usar preservativos. Bento XVI: (...) Em minha intervenção, eu não estava fazendo uma declaração geral sobre o tema do preservativo, mas apenas dizendo - e isto é o que causou grande ofensa -, que não podemos resolver o problema mediante a distribuição de preservativos. Resta muito o que fazer. Devemos estar próximos das pessoas; devemos guiá-los e ajudá-los; e temos que fazer isto antes e depois do contágio com a doença. É um fato, como você já sabe, que as pessas podem obter preservativos quando o desejarem, de qualquer modo. Porém, isto serve apenas para demonstrar que os preservativos por si próprios não resolvem o problema em si mesmo. Muito mais precisa ser feito. Enquanto isso, no âmbito secular, desenvolveu-se a teoria chamada 'ABC' - abstinência, fidelidade, preservativo -, em que se entende o preservativo somente como um último recurso, quando os outros dois pontos foram rejeitados. Isto quer dizer que concentrar-se no preservativo implica em uma banalização da sexualidade, e, além de tudo, é precisamente a origem perigosa da atitude da sexualidade, não como a expressão do amor, mas como uma espécie de entorpecente que as pessoas administram a si mesmas. Esta é a razão pela qual a luta contra a banalização da sexualidade é parte também da luta para garantir que a sexualidade seja tratada como um valor positivo e para que possa ter um efeito positivo na totalidade de ser do homem". Consideremos que o argumento geral do Papa é que os preservativos não resolvem o problema da AIDS. Em apoio disto, ele aponta vários argumentos:

1) As pessoas já podem obter preservativos, mas é evidente que o problema não foi resolvido.

2) No mundo secular foi proposto o 'Programa ABC', em que o preservativo só será usado quando os dois primeiros procedimentos verdadeiramente eficazes - a abstinência e a fidelidade - tiverem sido rejeitados. Assim, a proposta secular do ABC reconhece inclusive que os preservativos não são a única solução. Eles não funcionam tão bem quanto a abstinência e a fidelidade. Os dois primeiros são melhores.

3) Concentrar-se no uso do preservativo representa uma banalização (trivialização) da sexualidade, que se converte de ato de amor em ato de egoísmo. Para que o sexo desempenhe o papel positivo que deve ter, esta banalização do sexo - e, portanto, a fixação nos preservativos - deve ser resistida.

Esse é o contexto da afirmação que a imprensa reproduziu:

"Pode haver casos individuais justificados como, por exemplo, quanto um prostituto usa um preservativo, e isto pode ser um primeiro passo para uma moralização, um primeiro ato de responsabilidade para desenvolver novamente a consciência de que nem tudo é permitido e que não se pode fazer tudo o que se quer. Porém, não é realmente a maneira de tratar com o mal da infecção pelo HIV, o que realmente pode apenas vir de uma humanização da sexualidade".
Há várias coisas a se considerar: em primeiro lugar, leve em conta que o Papa diz que: "Pode haver casos individuais justificados", e não que: "Está justificado". Esta é uma linguagem especulativa. Mas sobre o quê o Papa especula? Que o uso do preservativo está moralmente justificado? Não, não foi isso o que ele disse, mas que pode haver casos "sempre e quando [o uso do preservativo] pode ser um primeiro passo para uma moralização, um primeiro ato de responsabilidade para desenvolver novamente a consciência de que nem tudo é permitido".

Em outras palavras, como diz Janet Smith:

"O Santo Padre está simplesmente observando que para alguns prostitutos homossexuais o uso de um preservativo pode indicar um despertar do sentido moral, um despertar acerca de que o prazer sexual não é o valor máximo, mas que devemos ter o cuidado de não prejudicar ninguém em nossas escolhas. Ele não está falando de uma moralidade do uso de preservativos, mas de algo que pode ser certo sobre o estado psicológico daqueles que os usam. Se estas pessoas, usando preservativos, o fazem com o fim de evitar prejudicar outras, com o passar do tempo perceberão que os atos sexuais entre membros do mesmo sexo são intrinsecamente maus, já que não estão de acordo com a natureza humana".
Pelo menos isto é o máximo que se pode razoavemente inferir das declarações do Papa, o que poderia ser expresso com maior clareza (e espero que o Vaticano emita um esclarecimento urgente).

Em segundo lugar, repare que o Papa segue imediatamente sua declaração acerca da prostituição homossexual usuária de preservativos com a afirmação: "Porém, não é realmente a maneira de se tratar com o mal da infecção pelo HIV, o que realmente pode apenas vir de uma humanização da sexualidade".

Por "uma humanização da sexualidade", o Papa quer reconhecer a verdade sobre a sexualidade humana, que deve ser exercida de maneira amorosa, fiel entre um homem e uma mulher unidos em matrimônio. Esta é a verdadeira solução e não colocar um preservativo e manter relações sexuais promíscuas com pessoas infectadas com um vírus mortal.

Neste momento da entrevista, Seewald faz uma pergunta de continuidade, e é verdadeiramente um crime que o L'Osservatore Romana não tenha reproduzido esta parte:

"Seewald: Quer dizer, então, que a Igreja Católica, na realidade, não se opõe em princípio ao uso dos preservativos? Bento XVI: Ela, obviamente, não os considera como solução real ou moral, porém, neste ou em outro caso, pode haver, todavia, a intenção de reduzir o risco da infecção, como um primeiro passo para uma forma distinta e mais humana de viver a sexualidade". Assim, Bento XVI reitera que esta não é uma solução real (prática) para a crise da AIDS, nem tampouco uma solução moral. No entanto, em alguns casos, o uso de preservativo mostra "a intenção de reduzir o risco da infecção", que é "um primeiro passo para... uma forma mais humana de viver a sexualidade".

Portanto, não está dizendo que o uso de preservativos é justificado, mas que pode mostrar uma intenção particular e que esta intenção é um passo na direção correta.

Janet Smith oferece uma analogia útil:

"Se alguém fosse assaltar um banco e estava decidido em empregar uma arma de fogo, seria melhor para essa pessoa usar uma arma desmuniciada: reduzir-se-ia o risco de lesões mortais. Porém, não é tarefa da Igreja ensinar possíveis assaltantes de banco a assaltar bancos de uma maneira mais segura; menos ainda é tarefa da Igreja apoiar programas para oferecer a possíveis assaltantes de banco armas de fogo incapazes de ser municiadas. Não obstante, a intenção de um assaltante de banco em assaltar um banco de uma maneira que é mais segura para os funcionários e clientes do banco pode indicar um elemento de responsabilidade moral que poderia ser um passo para a compreensão final da imoralidade que é o assalto a bancos". Muito mais se poderia dizer de tudo isto, mas pelo que vimos, já resta claro que as declarações do Papa devem ser lidas com cuidado e que não constituem o tipo de licença para o uso de preservativos que os meios de comunicação desejam.

Há mais por vir...

Autor: José Miguel Arráiz
Fonte: http://infocatolica.com/blogspot/apologeticamundo
Tradução: Carlos Martins Nabeto

A FALSA "TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO"


A segunda metade do século XX, sobretudo nas suas últimas três décadas, assistiu a tentativas mais ou menos grosseiras de manipulação da figura de Jesus Cristo para apoiar modelos de vida, de sociedade e de ação política que pouco ou nada têm a ver com o Jesus da História e da Fé. Assim surgiu o Cristo cósmico ou esotérico da Nova Era, o Cristo "hippie" da geração de 1968 e o Cristo revolucionário da ala marxista da Teologia da Libertação.

Nas últimas décadas, muitos dentro e fora da Igreja tentaram promover a ideologia política esquerdista disfarçando-a com roupagem cristã. Dessa maneira, a fé cristã é reduzida a um instrumento para a libertação das classes operárias. Aqueles que apóiam a ideia de uma sociedade cristã supostamente comunista usam frequentemente textos extraídos das Sagradas Escrituras que, isolados do seu contexto, parecem apoiar a ideia de uma sociedade cristã onde não existe propriedade privada e onde as riquezas materiais são intrinsecamente más. Estas ideias e outras que compõem a Teologia da Libertação passam por cima da mensagem completa do Evangelho, reduzindo-o e privando-o de sua verdadeira mensagem libertadora.

A Doutrina Social da Igreja exorta à caridade para com aqueles menos afortunados e à uma justa distribuição das riquezas na socidade cristã. A Igreja vai além da mera exortação e pratica a caridade através de todos os meios ao seu alcance, o que pode ser facilmente comprovado pela cuidadosa observação da atividade internacional dos inúmeros grupos caritativos católicos sustentados pela Igreja. Estas atividades caritativas surgem a partir do coração da Igreja e são uma manifestação do seu espírito agindo livremente como imitação de Cristo, o qual viveu o seu ministério rodeado dos mais necessitados dentro o povo do seu tempo. Ao analisarmos as partes da Escritura citadas com maior frequência pelos propagadores da Teologia da Libertação, percebemos que nenhuma delas exorta à partilha obrigatória das riquezas, nem ao emprego da violência, nem tampouco à luta de classes:

"Nem havia entre eles nenhum necessitado, porque todos os que possuíam terras e casas vendiam-nas e traziam o preço do que tinham vendido e depositavam-no aos pés dos apóstolos. Repartia-se então a cada um deles conforme a sua necessidade" (Atos 4,34-35).

Esta prática comunitária da Igreja da antiga Jerusalém é certamente louvável. É de se supor que o incipiente número de cristãos nesses anos tornasse possível o justo partilhamento dos recursos do grupo. Sabemos também que aqueles que compartilhavam os seus bens o faziam de maneira voluntária. Em nenhum lugar encontramos a Bíblia aprovar o confisco da propriedade privada. Na Igreja primitiva, toda pessoa que ajudava os pobres o fazia livremente. Ninguém tomava as posses dos outros para entregá-las aos pobres. Fazer tal coisa seria visto como roubo, uma violação ao livre-arbítrio do indivíduo.

"Um certo homem chamado Ananias, de comum acordo com sua mulher Safira, vendeu um campo e, combinando com ela, reteve uma parte da quantia da venda. Levando apenas a outra parte, depositou-a aos pés dos apóstolos. Pedro, porém, disse: 'Ananias, por que tomou conta Satanás do teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo e enganasses acerca do valor do campo? Acaso não o podias conservar sem vendê-lo? E depois de vendido, não podias livremente dispor dessa quantia? Por que imaginaste isso em teu coração? Não foi aos homens que mentiste, mas a Deus'. Ao ouvir estas palavras, Ananias caiu morto. Apoderou-se grande terror de todos os que o ouviram. Uns moços retiraram-no dali, levaram-no para fora e o enterraram. Depois de umas três horas, entrou também sua mulher, nada sabendo do ocorrido. Pedro perguntou-lhe: 'Dize-me, mulher. Foi por tanto que vendestes o vosso campo?' Respondeu ela: 'Sim, por esse preço'. Replicou Pedro: 'Por que combinastes para pôr à prova o Espírito do Senhor? Estão ali à porta os pés daqueles que sepultaram teu marido. Hão de levar-te também a ti'. Imediatamente caiu aos seus pés e expirou. Entrando aqueles moços, acharam-na morta. Levaram-na para fora e a enterraram junto do seu marido" (Atos 5,1-10).
Um bom exemplo é o caso de Ananias e Safira, dois cristãos dessa época que pretenderam enganar o Apóstolo São Pedro retendo parte do dinheiro que haviam obtido com a venda de um campo. Observe-se que São Pedro os condena por mentir e por fazerem crer à Igreja que estavam entregando tudo, quando na verdade reservaram para si uma parte [do dinheiro]. O Apóstolo recorda-lhes que tinham a liberdade de reter para si o campo, o dinheiro da venda ou uma parte da sua totalidade, já que tinham todo o direito de fazer o que bem quisessem com a sua propriedade. No entanto, Ananias e Safira pretendiam que a comunidade os considerasse por bastante abnegados e generosos, buscando de fato a vã e passageira admiração dos homens e não o favor de Deus. Por suas ações, demonstraram não crer na presença do Espírito Santo na Igreja e foram condenados de maneira fulminante.

"Jesus fixou nele o olhar, amou-o e disse-lhe: 'Uma só coisa te falta; vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me'. Ele entristeceu-se com estas palavras e foi-se todo abatido, porque possuía muitos bens" (Marcos 10,21-22).
O jovem rico se aproxima de Cristo mas não consegue renunciar às suas riquezas. Cristo sempre falou da liberdade individual para escolher o bom caminho ou para se afastar do mesmo. Ele sabia que a coerção - inclusive por bons motivos aparentes - viola a verdadeira natureza da humanidade. Deus nos criou com livre-arbítrio. É um dom que Ele nunca retira. O homem rico errou ao valorizar os bens materiais, colocando-os acima da chamada de Cristo. Esperamos que, em algum momento posterior, este jovem tenha tomado consciência do seu erro e seguido ao Senhor. Porém, tirar-lhe à força as suas posses seria uma grave violação da sua vontade (inclusive da sua própria pessoa) e Cristo nunca o teria feito. Isso não implica, como bem afirma a Doutrina Social da Igreja, que os governos não possam regular a economia, basicamente através de impostos ou meios semelhantes, para assegurar a assistência aos mais necessitados. Deus valoriza tanto o nosso livre-arbítrio que realmente esconde de nós o Seu Rosto neste mundo. Se tivéssemos uma percepção direta de Deus, deixaríamos de ser indivíduos livres e nos converteríamos em meros aduladores temerosos, intimidados pela presença onipotente do Todo-Poderoso.

"Deram ali uma ceia em sua honra. Marta servia e Lázaro era um dos convivas. Tomando Maria uma libra de bálsamo de nardo puro, de grande preço, ungiu os pés de Jesus e enxugou-os com seus cabelos. A casa encheu-se do perfume do bálsamo. Mas Judas Iscariotes, um dos seus discípulos, aquele que o havia de trair, disse: 'Por que não se vendeu este bálsamo por trezentos denários e não se deu aos pobres?' Dizia isso não porque ele se interessasse pelos pobres, mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, furtava o que nela lançavam. Jesus disse: 'Deixai-a; ela guardou este perfume para o dia da minha sepultura. Pois sempre tereis convosco os pobres, mas a mim nem sempre me tereis'" (João 12,2-8).
Aqui vemos como Judas hipocritamente condena o presente que a pecadora confere a Jesus como gesto de arrependimento. Aqui São João nos adverte que o motivo real de Judas não era o amor pelos pobres mas a avareza. Do mesmo modo, muitos "revolucionários" da História recente têm usado as necessidades das pessoas como desculpa para alcançar o poder civil e, logo depois, esquecer completamente os pobres e os operários. Sabe-se muito bem que nos governos comunistas de Cuba, da União Soviética, dos países do Oriente Europeu e Coréia do Norte os pobres e os operários formam uma classe aparte e de nível mais baixo, que não desfruta da mesma qualidade de vida e liberdade de locomoção que os membros das burocracias governantes.

As únicas ocasiões em que a Bíblia apresenta pessoas privadas - justamente! - das suas posses é quando elas transgrediram alguma lei (Neemias 5,13; 2Crônicas 21,14; Esdras 10,8). Os regimes de força esquerdistas, ao contrário, parecem mostrar-se impacientes para violar a liberdade individual. Consideram virtuoso usar a força para arrebatar a propriedade privada e - supostamente - dá-la aos que possuem menos. No entanto, cabe perguntar: existe alguma virtude ou mérito em fazer aquilo que somos obrigados a fazer?

Jesus nunca foi comunista e muito menos guerrilheiro. Defendeu o amor ao próximo e a livre doação de bens particulares aos que passam por necessidade, como de fato a Igreja continua ensinando. Cristo não tomou à força a propriedade de ninguém, nem instituiu impostos, nem confiscou barcos de pesca ou granjas, mesmo ao aceitar a legitimidade dos impostos quando disse: "Dai a César o que é de César".

Vale a pena reforçar que a Igreja Católica está profundamente comprometida em ajudar os pobres. Muitos de seus homens e mulheres são exemplos de santidade pelo serviço que prestaram aos necessitados, como, por exemplo, São Vicente de Paulo, Pierre Toussaint, São Martinho de Porres e Madre Teresa de Calcutá. Escola, hospitais, orfanatos, missões e abrigos católicos para os pobres encontram-se espalhados por todo o globo.

Atualmente, na África, onde a AIDS e os governos tirânicos têm provocado as mais severas e infelizes condições de vida sobre a terra, a Igreja Católica proporciona mais assistência social que qualquer outra instituição. E isto apesar de na África o número de muçulmanos superar o número de cristãos!

"Meus irmãos, na vossa fé em nosso glorioso Senhor Jesus Cristo, guardai-vos de toda consideração de pessoas. Suponde que entre na vossa reunião um homem com anel de ouro e ricos trajes, e entre também um pobre com trajes gastos; se atenderdes ao que está magnificamente trajado, e lhe disserdes: 'Senta-te aqui, neste lugar de honra', e disserdes ao pobre: 'Fica ali de pé', ou: 'Senta-te aqui junto ao estrado dos meus pés', não é verdade que fazeis distinção entre vós, e que sois juízes de pensamentos iníquos? Ouvi, meus caríssimos irmãos: porventura não escolheu Deus os pobres deste mundo para que fossem ricos na fé e herdeiros do Reino prometido por Deus aos que o amam? Mas vós desprezastes o pobre! Não são porventura os ricos os que vos oprimem e vos arrastam aos tribunais? Não blasfemam eles o belo nome que trazeis? Se cumprirdes a lei régia da Escritura: 'Amarás o teu próximo como a ti mesmo', sem dúvida fazeis bem. Mas se vos deixais levar por distinção de pessoas, cometeis uma falta e sereis condenados pela lei como transgressores" (Tiago 2,1-9). O Apóstolo Tiago nos recorda que o próprio Deus tem preferido os fiéis pobres para premiá-los com a glória do seu Reino e lhes outorgou as riquezas da verdadeira fé. Isto era evidente para Tiago, o qual era o bispo responsável pelo pastoreio dos fiéis da Palestina. Ali, as classes dominantes eram formadas principalmente por aqueles que não tinham crido em Cristo; e os membros das classes mais humildes, os que tinham sido premiados com a graça divina da fé. É por isso que Tiago lhes recorda - aos presbíteros e a toda comunidade - que a preferência por pessoas ricas e influentes está em clara oposição ao favor de Deus pelos pobres. Observe-se que Tiago não condena os ricos por sua condição econômica, mas condena as distinções porque constituem uma falta de amor ao próximo.

"Falai, pois, de tal modo e de tal modo procedei, como se estivésseis para ser julgados pela lei da liberdade. Haverá juízo sem misericórdia para aquele que não usou de misericórdia. A misericórdia triunfa sobre o julgamento. De que aproveitará, irmãos, a alguém dizer que tem fé, se não tiver obras? Acaso esta fé poderá salvá-lo? Se a um irmão ou a uma irmã faltarem roupas e o alimento cotidiano, e algum de vós lhes disser: 'Ide em paz, aquecei-vos e fartai-vos, mas não lhes der o necessário para o corpo, de que lhes aproveitará?' Assim também a fé: se não tiver obras, é morta em si mesma. Mas alguém dirá: 'Tu tens fé, e eu tenho obras. Mostra-me a tua fé sem obras e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras'" (Tiago 2,12-18).
Tiago não poderia ser mais claro: a fé e a caridade prática seguem unidas.

"Vós, ricos, chorai e gemei por causa das desgraças que sobre vós virão. Vossas riquezas apodreceram e vossas roupas foram comidas pela traça. Vosso ouro e vossa prata enferrujaram-se e a sua ferrugem dará testemunho contra vós e devorará vossas carnes como fogo. Entesourastes nos últimos dias! Eis que o salário, que defraudastes aos trabalhadores que ceifavam os vossos campos, clama, e seus gritos de ceifadores chegaram aos ouvidos do Senhor dos exércitos. Tendes vivido em delícias e em dissoluções sobre a terra, e saciastes os vossos corações para o dia da matança! Condenastes e matastes o justo, e ele não vos resistiu" (Tiago 5,1-6).
Tiago nos revela também que as riquezas obtidas através da opressão, do crime e da injustiça não apenas se evaporam como também custarão a salvação àqueles que depositaram sua confiança nelas. Há alguns que utilizam esta passagem para condenar aqueles que obtêm suas riquezas trabalhando honestamente. Isto é um erro! O Apóstolo Tiago condena aqui o materialismo imoral que compartilham todos aqueles que empregam meios ilícitos para obter para si mesmos as riquezas deste mundo.

Tanto o que explora imoralmente aqueles que dependem dele pelo trabalho, como ainda o privilegiado por uma ditadura que vive às custas dos operários são igualmente culpáveis à vista de Deus, independente da orientação política que ostentam.

O burocrata que ascendeu a uma posição privilegiada com a desculpa de "servir aos operários" faz o mesmo que Judas Iscariotes: serve-se do tesouro da comunidade sob o pretexto de defendê-la. Os países nos quais o comunismo tomou o poder sempre produziram uma "nomenklatura", um grupo de privilegiados que vive uma vida melhor que o resto da população.

A Igreja encontra-se radicalmente comprometida a favor da verdadeira justiça social: aquela que defende a dignidade, inclusive dos mais fracos entre nós - os pobres, os oprimidos, os não-nascidos e os idosos - e nos chama a cada um de nós a sermos protetores dos nossos irmãos. Entretanto, ela busca mudar o coração dos homens, não apenas a lista das suas propriedades, porque no dia em que o nosso mundo estiver habitado por mais e mais fiéis cristãos verdadeiros necessariamente será um mundo mais justo e humano.

Como observação final: quem pode negar que a imensa maioria dos cem milhões de inocentes assassinados pelos regimes totalitários nos últimos 100 anos foram precisamente os mais pobres?

Autor: Carlos Caso-Rosendi
Fonte: http://voxfidei-apologetica.blogspot.com/
Tradução: Carlos Martins Nabeto